quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Remédios que matam

Remédios que matam
Data de publicação : 21 Outubro 2010 - 2:42pm
Por Ana Fuentes (Foto: Flickr/Javier Velez)
A Organização Mundial da Saúde adverte que, em escala mundial, 10% dos medicamentos são adulterados. Devido ao deficiente controle de segurança em alguns países da América Latina, a cifra pode chegar a 30%.
A China é um dos principais fabricantes e provedores destes remédios, que provocam danos graves e inclusive a morte de pacientes.
Em São José, na Costa Rica, discutiu-se recentemente pela primeira vez sobre a venda ilegal de medicamentos e produtos falsificados. Comprimidos idênticos aos originais, mas adulterados com giz, pólen ou farinha; xaropes que não contém nenhum princípio ativo ou que, pior ainda, podem ter substâncias que causam a morte. Grande parte destes medicamentos piratas são provenientes da China, país que fabrica excelentes cópias de quase tudo, desde bolsas de mão a agasalhos. E medicamentos.
Lacunas legais
As imitações de medicamentos são muito requintadas, imitadas em todos os milímetros. As máfias as inserem tanto no mercado interno como no exterior, principalmente em países em desenvolvimento da América Latina ou África, onde podem se beneficiar das lacunas legais e do alto preço dos produtos autênticos, inacessíveis para grande parte da população. Os países mais atingidos da América Latina são Peru, Brasil, Paraguai e Colômbia, asseguram os especialistas do setor, que explicam que é difícil seguir o caminho feito por estes remédios por mudarem de mãos umas 30 vezes antes de chegar ao consumidor final.
Dentro da China, os escândalos também se multiplicam. Em janeiro, duas pessoas perderam a vida em Xinjiang, no noroeste do país, após ingerir medicamentos falsos contra diabetes. Seis meses depois, Baidu, o maior site de buscas na internet, foi acusado de redirecionar aos usuários para páginas que vendiam remédios falsos para a pele e para estimular a potência sexual. Cerca de três mil pessoas foram afetadas.
Mas a internet não é o único canal de venda desses produtos, que também podem ser obtidos em hospitais, farmácias e até mesmo na rua. Existem tantos vendedores clandestinos quanto compradores que se arriscam a adquirir um produto falso por não poder pagar pelo original. Ainda que não hajam números nem oficiais nem exatos, alguns médicos chineses publicam que neste país asiático morrem vários milhares de pessoa por ano por ingerir remédio adulterado.
Vacina vencida
Em 2006, as autoridades sanitárias da província de Shaanxi, ao sudoeste de Pequim, chegaram a um acordo com uma empresa privada. Segundo a investigação realizada por um jornal chinês, a companhia conseguiu, por quase meio milhão de euros, o monopólio de venda e distribuição de vacinas.
O empresário obteve um lucro de 12 milhões de euros em dois anos, ainda que as vacinas estivessem armazenadas em um local impróprio e já estavam vencidas quando foram aplicadas. Como conseqüência, várias crianças morreram e centenas sofrem de epilepsia, além de outras seqüelas incuráveis. As autoridades não condenaram o culpado.
Evitar escândalo
Zhang e Ma estão praticamente falidos por causa dos gastos médicos com seus filhos, e vigiados 24 horas por dia pelas autoridades para que não provoquem nenhum escândalo. “No posto de saúde local, me disseram que as convulsões não tinham nada a ver com a vacina, mas eu investiguei por minha conta e descobri que a vacina estava vencida”, assegura Zhang. “Meu filho continua no hospital e seu tratamento custa cerca de 1200 euros por mês. Já gastei mais de 25 mil euros com a saúde dele”.
Ao seu lado, Ma concorda e explica seu caso. “O colégio não nos consultou antes de vacinar minha filha, não pediram autorização aos pais. E logo descobrimos que a clínica com que trabalhavam era ilegal. Não cumpriram o regulamento e o pessoal não estava qualificado para vacinar, mas assim ganhavam dinheiro. Minha filha contraiu encefalomielite, uma inflamação do sistema nervoso central”.
Ma foi várias vezes a Pequim para protestar diante do Ministério da Saúde. Nunca consegui uma explicação nem uma indenização. “Até agora não tive medo, mas cada vez me sinto mais em perigo porque já me prenderam duas vezes e ameaçaram me enviar a um campo de trabalho da próxima vez. Quando nos pegam, nos mandam de novo ao nosso povoado, não querem que estejamos em Pequim. Mas se nos dessem uma resposta convincente não teríamos que continuar vindo para a capital, que fica a centena de quilômetros de nossa casa. Temos família, um trabalho, não viemos aqui porque gostamos.”
Na América Latina, há 30% de chance de se comprar um medicamento falso. Na China, há também o risco de ser uma vítima perseguida pelas autoridades.

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