quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Censura na Internet

Censura na Internet

A grande muralha (digital) dos EUA
Sob pressão para proteger a propriedade intelectual na internet, Congresso dos EUA avalia legislação equivocada que pode fortalecer o sistema de ‘firewall’ da China. Por Rebecca MacKinnon*
17/11/2011
EUA podem censurar internet para proteger direitos autorais (Reprodução/Internet)
A China opera o sistema mais elaborado e nebuloso do mundo de censura na Internet. Mas o Congresso dos EUA, sob pressão para combater o roubo de propriedade intelectual na Rede, está considerando uma legislação equivocada que iria fortalecer a grande ‘firewall’ (sistema de filtros que restringe o acesso a determinados sites na internet) da China e até mesmo implementar as principais características deste sistema nos Estados Unidos.
A legislação – introduzida no Senado como a Lei de Proteção a IPs, e na Câmara como a Lei antiPirataria Online – tem uma impressionante variedade de apoiadores bem financiados, incluindo a Câmara de Comércio dos EUA, a Motion Picture Association of America, a Federação Americana de Músicos, o Directors Guild of America, a Irmandade Internacional de Caminhoneiros e o Screen Actors Guild. As duas versões da legislação não pretendem censurar o discurso político ou religioso, como acontece na China, mas apenas proteger a propriedade intelectual norte-americana. Preocupação com a reprodução de obras criativas na internet é justificável. As soluções oferecidas pela legislação, no entanto, ameaçam infligir danos colaterais ao discurso democrático e à oposição, tanto em casa como ao redor do planeta.
Com a nova lei, o procurador-geral teria o poder de criar uma lista negra de sites a serem bloqueados por provedores de internet, ferramentas de busca, provedores de pagamentos e redes de publicidade, tudo isso sem uma audiência pública ou um julgamento prévio. A versão da Câmara vai mais longe, permitindo que empresas privadas entrem com ações contra prestadores de serviços que violarem leis de direito autoral, mesmo que brevemente ou sem saber — uma mudança brusca com relação à legislação vigente, que protege os prestadores de serviços de qualquer responsabilidade civil se o prestador remover o conteúdo protegido imediatamente após uma notificação. A intenção dos EUA não é a mesma que levou à criação da grande firewall da China, — um sistema estatal de censura da internet –, mas o efeito prático pode ser similar.
O efeito sobre sites com conteúdo colaborativo como o YouTube, por exemplo, seria arrepiante. YouTube, Twitter e Facebook têm desempenhado um papel importante em manifestações políticas de Tahrir Square a Wall Street. Atualmente, os serviços oferecidos pelas redes sociais são protegidos por um “porto seguro” inserido na Lei Digital Millennium Copyright, que concede imunidade a estes sites na medida em que agirem de boa fé para derrubar o conteúdo infrator, logo que os detentores dos direitos alertarem para o uso indevido de conteúdo autoral. O projeto da Câmara, que acabaria com esta imunidade, colocaria o ônus sobre as redes sociais, que teriam de retirar o conteúdo roubado ou arriscar uma ação legal. A nova lei colocaria o Twitter em uma posição semelhante à de seu homólogo chinês, o Weibo, que supostamente emprega cerca de mil pessoas para monitorar e censurar o conteúdo de usuários e assim garantir a manutenção das boas relações da empresa com as autoridades do governo.
O potencial para abuso de poder por meio de redes digitais – da qual nós, como cidadãos, dependemos para quase tudo, incluindo assuntos políticos – é uma das ameaças mais insidiosas para a democracia na era da internet. Vivemos em uma época de polarização política tremenda. A confiança pública no governo e empresas está em baixa, e merecidamente. Isso não é hora para políticos e lobistas em Washington elaborarem novos mecanismos de censura na internet, adicionando novas oportunidades para abuso de poder corporativo e governamental. Embora a propriedade intelectual mereça proteção, essa proteção deve ser alcançada de modo que não sufoque a inovação ou enfraqueça a proteção dos direitos civis e políticos na internet.
*Rebecca MacKinnon é pesquisadora do New America Foundation

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