Proteína infecciosa da doença de Alzheimer foi vista a passar de neurónio para neurónio
30.06.2012 - 02:28 Por Teresa Firmino
Têm surgido novos olhares sobre os mecanismos da doença de
Alzheimer (DR)
Cientistas da Suécia conseguiram ver, usando neurónios coloridos,
que uma proteína se transmite no cérebro como se fosse uma infecção,
desencadeando a doença de Alzheimer. É o segundo artigo científico numa semana
que aponta para o mesmo sentido: esta doença é causada por proteínas que se
tornam "infecciosas" e se acumulam no cérebro.
O primeiro trabalho era da equipa de Stanley Prusiner, o cientista que
descobriu as proteínas infecciosas, ou priões, e ganhou por isso o Prémio Nobel
da Medicina em 1997. Agora, a equipa de Martin Hallbeck, da Universidade de
Linköping, na Suécia, conseguiu observar, nas suas experiências, como é que
essas proteínas se transmitem entre neurónios.
A doença de Alzheimer
provoca a deterioração progressiva e irreversível das funções cognitivas, como a
memória, a linguagem e o pensamento. Embora nalgumas famílias seja hereditária,
90% dos casos não têm causas identificadas. Atinge mais de 90 mil portugueses,
segundo a associação Alzheimer Portugal.
A doença caracteriza-se
sobretudo pela formação de placas no cérebro, compostas pela proteína
beta-amilóide, que cria agregados tóxicos à volta dos neurónios. Debate-se há
anos se a beta-amilóide é a causa ou a consequência da doença.
Mas na
semana passada a equipa de Prusiner avançou na compreensão da Alzheimer: propôs,
na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), que os
depósitos de beta-amilóide são priões.
A história dos priões está ligada
às encefalopatias espongiformes, como a doença das vacas loucas e a
Creuzfeldt-Jakob, a sua equivalente humana. Prusiner, da Universidade da
Califórnia, propôs que estas doenças tinham uma causa infecciosa - mas que não
se deviam nem a bactérias nem a vírus. Eram proteínas capazes de se replicarem,
mesmo sem terem material genético, a que chamou priões. Nas encefalopatias
espongiformes, Prusiner mostrou que os priões de uma certa proteína no cérebro
(a PrP) conseguiam converter a sua congénere normal e originar as encefalopatias
espongiformes. Durante anos, viu a proposta recusada pela comunidade científica,
mas valeu-lhe o Nobel.
No artigo na PNAS, a equipa de Prusiner quis
saber se na doença de Alzheimer, na qual também está envolvida uma proteína,
ocorria o mesmo. Os cientistas injectaram acumulações de beta-amilóide no
cérebro de ratinhos geneticamente predispostos para a Alzheimer. Ao fim de uns
meses não só verificaram que os depósitos tinham aumentado como se tinham
propagado a todo o cérebro dos animais. Essa disseminação é dos primeiros passos
da doença. Com esta mudança de paradigma face à Alzheimer, dizia a equipa,
talvez se desvendem os seus mecanismos, para a propagação dos
priões.
Agora, a equipa de Martin Hallbeck relata na última edição da
revista The Journal of Neuroscience como conseguiu provar que pequenos
agregados (oligómeros) de beta-amilóide se propagam de neurónio para neurónio -
"algo que muitos investigadores tentaram fazer antes, mas não conseguiram", diz
Hallbeck, num comunicado da sua universidade.
Células às
cores
Nas suas experiências, esta equipa injectou pequenos agregados
de beta-amilóide em neurónios de rato cultivados em laboratório. Como os
agregados estavam tingidos por uma tinta vermelha fluorescente, no dia seguinte
os cientistas viram que os neurónios na vizinhança também já tinham ficado da
mesma cor.
Para testarem se os neurónios doentes seriam capazes de
infectar outros, fizeram experiências com neurónios humanos: desta vez,
tingiram-nos com uma tinta verde e misturaram-nos com outros, que já estavam
vermelhos depois de terem recebido a beta-amilóide. Ao fim de um dia, quase
metade das células verdes tinham estado em contacto com as vermelhas e, nos dois
dias seguintes, a equipa viu cada vez mais neurónios verdes doentes. Por
exemplo, os seus axónios, os prolongamentos que transmitem os impulsos nervosos
a outros neurónios, perderam a forma. Mas os que não apanharam os agregados não
foram afectados.
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