Argentina aprova lei da 'morte digna'
Atualizado em 9 de maio,
2012 - 22:09 (Brasília) 01:09 GMT
Os parlamentares argentinos aprovaram, nesta quarta-feira, a
lei chamada de "morte digna", que permite ao paciente terminal ou em estado
irreversível rejeitar tratamentos médicos que possam prolongar seu sofrimento ou
"vida artificial", conectada aos aparelhos.
O texto, que já tinha sido aprovado em novembro pela Câmara dos Deputados
teve aprovação por unanimidade pelos senadores.
A lei estabelece o "direito de aceitar ou rejeitar determinados tratamentos
médicos", dando a palavra final ao paciente, que deve deixar por escrito uma
autorização de suspensão destes cuidados. Um familiar próximo do paciente também
está habilitado a autorizar o tratamento, nos casos em que a pessoa
hospitalizada não esteja consciente.
Na prática, os parlamentares modificaram a Lei sobre Direitos do
Paciente.
A aprovação da lei levou familiares de pacientes terminais a comemorarem a
decisão com aplausos e abraços nas galerias do Senado argentino.
Entre os que comemoravam estava Selva Herbon, que liderou uma campanha junto
a políticos e órgãos públicos para que a lei fosse aprovada.
Ela é mãe de uma menina de três anos, Camila, que mora num hospital de Buenos
Aires e está inconsciente desde que nasceu. Em entrevista à BBC Brasil, no ano
passado, ela disse que a "morte digna" se justificava para a filha, já que a
bebe não tinha reflexos ou qualquer forma de reação.
"Ela não chora, não ri, não sente nada mesmo quando apenas toco sua pele.
Camilla apenas cresce em uma cama de hospital e conectada a aparelhos", disse na
ocasião.
Dignidade
O texto contou com apoio de parlamentares de diferentes linhas políticas. O
senador governista Aníbal Fernández, da Frente para a Vitória (FPV), disse que a
lei "não vai contra nenhuma religião" e pretende "respeitar a dignidade" do
paciente.
Ele declarou ainda que a medida não significará a autorização da eutanásia,
mas sim o direito de um paciente terminal ter, de fato, uma "morte digna".
"O objetivo desta lei é evitar o sofrimento e respeitar a autonomia do
paciente para que ele defina a sua qualidade de vida", disse o senador José Cano
(do partido opositor União Cívica Radical, UCR), presidente da Comissão de Saúde
e Esporte e defensor da medida. Para ele, a lei tem "caráter humanitário".
Polêmica
A nova legislação permite que o paciente que já deixou a sua determinação por
escrito possa voltar atrás, se mudar de ideia e optar pela continuidade do
tratamento. O familiar do paciente também poderá mudar de ideia, quando ele
estiver inconsciente.
A nova lei adverte, porém, que "fica expressamente proibida a prática de
eutanásia" e inclui que nenhum profissional de saúde será punido por atender a
vontade do paciente ou da orientação dada por um familiar da pessoa
internada.
O item do texto que gerou mais polêmica foi o que permite ao paciente ou ao
familiar autorizado a suspensão da alimentação e nutrição através do soro.
"Sou a favor do texto, mas contra a permissão para a suspensão da hidratação
e alimentação dos doentes terminais. Isto é contra a morte digna, já que provoca
dor e, além disso, desrespeita as normas da Organização Mundial de Saúde", disse
a senadora Sonia Escudero.
Recentemente, duas províncias argentinas, Río Negro e Neuquén, já haviam
aprovado leis similares.
Em termos nacionais, a Argentina passa a ser um dos poucos países no mundo a
permitir a "morte digna". Os outros são Holanda, Bélgica e Luxemburgo. Três
Estados dos Estados Unidos também a autorizam e a medida vem sendo discutida na
Grã-Bretanha e na Espanha.
O governo espanhol enviou um projeto de lei, no ano passado, ao Parlamento,
onde será debatido.
Transsexuais
A Argentina também aprovou nesta quarta-feira a lei que permite que
transsexuais mudem o nome de batismo no documento de identidade.
O texto já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e foi aprovado, nesta
quarta, por unanimidade, pelos senadores. A lei permite que pessoas maiores de
18 anos mudem seu nome no documento de identidade e mantenham o número de seu
documento original.
Segundo parlamentares governistas, esta lei é complementar à que foi aprovada
em 2010, autorizando o casamento entre pessoas do mesmo sexo. "A sociedade
argentina é um pouco melhor a partir desta noite porque permite que as pessoas
sejam mais felizes", afirmou o líder do governo no Senado, senador Michel
Pichetto.
A lei prevê ainda que a rede pública realize as "operações e tratamentos para
adaptação do corpo" da pessoa atraves das chamadas "obras sociais" - planos de
saúde dos sindicatos do país.
A aprovação da lei foi comemorada por diferentes entidades sociais, com
cartazes e bandeiras dentro e fora do Congresso Nacional.
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