sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

‘Pedi asilo após sofrer ameaças’

‘Pedi asilo após sofrer ameaças’, diz pai de menino com órgãos doados

22/02/2013 08h42- Atualizado em 22/02/2013 08h44

Pavesi vive na Europa desde 2008 após sofrer represálias em Poços.
Ele denunciou a Santa Casa por suposto tráfico de órgãos do filho.

Jéssica BalbinoDo G1 Sul de Minas

“Fui ameaçado, intimado e humilhado”, disse o gerente de sistemas Paulo Pavesi, de 44 anos, que em 2008 precisou pedir asilo à Itália para sair de Poços de Caldas (MG) após denunciar irregularidades na retirada de órgãos do filho Paulo Veronesi Pavesi, em 2000.
O caso voltou a ter repercussão após a condenação de quatro médicos envolvidos com a remoção e o transplante de órgãos do paciente José Domingos de Carvalho, morto aos 38 anos em 18 de abril de 2011, na Santa Casa de Poços de Caldas.
Caso veio à tona após a morte de um menino de 10 anos, Paulo Pavesi (Foto: Reprodução EPTV)Garoto de 10 anos teve os órgãos retirados na Santa Casa de Poços de Caldas (Foto: Reprodução EPTV)
De acordo com Pavesi, desde que denunciou no ano 2000 a cobrança feita pelo hospital referente à internação do filho, que morreu aos 10 anos após cair de uma altura de 10 metros e teve os órgãos retirados na Santa Casa da cidade, passou a ser ameaçado. “A cidade se voltou contra mim e me apontaram como alguém que queria destruir a Santa Casa. Passei a receber e-mails e recados de todos os lados. Me denunciaram à Justiça por injúria, calúnia e difamação, até eu deixar a cidade”, contou.
Afrontei poderes que até hoje ninguém em Poços de Caldas teve coragem de afrontar"
Paulo Pavesi
autor da primeira denúncia
A denúncia do hospital e da retirada dos órgãos teve início quando Pavesi foi pagar a conta do hospital. “Eu percebi que tinha algo errado no prontuário que me mostraram. Tinha muitas rasuras e a cobrança era claramente abusiva. Até então eu nem imaginava o que haviam feito, foi então que levei o caso ao Ministério da Saúde e a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos”, comentou.
Após desentendimentos com o Ministério Público durante o processo de investigação do caso que ficou conhecido como a Máfia dos Órgãos, Pavesi recebeu o convite de uma Ong italiana de combate à pedofilia para apresentar o caso na Europa e em seguida pediu asilo ao país. “Eles entenderam que eu corria riscos e me apoiaram no pedido de asilo. Mas a mudança foi traumática. Pedir asilo não é algo agradável. Fui enviado para um centro de asilados onde dividia o quarto com um paquistanês e dois nigerianos, que se tornaram muito amigos, mas era como se eu estivesse preso em um regime semi-aberto. Eu podia sair às 8h mas tinha que voltar antes das 19h. Era monitorado durante 24 horas, embora tenha sido muito bem tratado. Contudo, a Itália hoje é a minha pátria. Amo o país como se estivesse nascido aqui”, disse.
Paulo Pavesi em coletiva de imprensa sobre o documentário H.O.T. (Foto: Arquivo Pessoal)Paulo Pavesi em coletiva de imprensa na Europa sobre o documentário H.O.T. (Foto: Arquivo Pessoal)
Atualmente Pavesi vive em Londres. Ele conseguiu a cidadania italiana um ano após chegar ao país e não precisou mais do asilo. No entanto ele não pretende voltar ao Brasil, nem mesmo para acompanhar o julgamento dos quatro médicos indiciados por homicídio doloso pela retirada dos órgãos do garoto de 10 anos. “Não volto mais para o Brasil. Não vale a pena. A minha presença não vai mudar em nada o julgamento e depois de tudo que vi, não posso afirmar que haverá julgamento. Temo que o juiz não fique muito tempo no cargo, já que está afrontando os poderes da cidade”, destacou.
Mesmo longe, o gerente de sistemas teme as ameaças sofridas. “Afrontei poderes que até hoje ninguém em Poços de Caldas teve coragem de afrontar. Obviamente que existe risco”, disse.
Com o asilo, Pavesi ficou longe do Brasil, mas não deixou de acompanhar o caso, as investigações e posta em um blog na internet fatos referentes ao processo. Participou também do documentário italiano Human Organ Traffic (HOT), que aborda o tráfico de órgãos no mundo.
Desdobramentos do caso
Com as denúncias feitas por Pavesi, o caso chegou à Polícia Federal, que iniciou a apuração do caso em 2000. O Inquérito apontou que quando a morte do garoto foi comprovada, ele estava sob efeito de substâncias depressivas do sistema nervoso central. Com isso, quatro médicos foram indiciados e outros seis inquéritos foram abertos.
A Santa Casa perdeu o credenciamento junto ao Ministério da Saúde para realizar transplantes. Desde janeiro de 2002, o hospital está impedido de realizar captação e transplante de órgãos. A exclusão do Sistema Nacional de Transplantes foi feita através da Secretaria de Assistência à Saúde (SAS) do Ministério da Saúde.
O caso também foi tema de discussões também no Congresso Nacional, durante a CPI que investigou o tráfico de órgãos. O Inquérito foi concluído um ano após o início das investigações.
Em 2010 a 1ª Vara Criminal de Poços de Caldas determinou que a equipe médica responsável pela cirurgia de retirada dos órgãos do menino Paulo Veronesi Pavesi iria a júri popular. Ainda não há previsão para o julgamento e os médicos indiciados aguardam em liberdade.

Os profissionais José Luiz Gomes da Silva, José Luiz Bonfitto, Marco Alexandre Pacheco da Fonseca e Álvaro Ianhez são acusados de homicídio qualificado e da retirada irregular de órgãos, tecidos ou partes do corpo humano irregularmente.
Médicos envolvidos com a Máfia dos Órgãos são condenados
Os médicos João Alberto Góes Brandão, Celso Roberto Frasson Scafi, Cláudio Rogério Carneiro Fernandes e Alexandre Crispino Zincone foram condenados pelo juiz da 1ª Vara Criminal de Poços de Caldas, Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, a penas que variam de oito a onze anos e seis meses de prisão em regime fechado por homicídio doloso, compra e venda de órgãos humanos, violação de cadáver e realização de transplante irregular. Embora condenados, eles podem recorrer em liberdade.
Juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro fala sobre reabertura de inquérito. (Foto: Reprodução EPTV / Michel Diogo) 
Juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro fala sobre a condenação. (Foto: Reprodução EPTV / Michel Diogo)
Segundo o juiz, alguns destes médicos estão envolvidos no caso Pavesi. “Para haver transplantes é preciso uma autorização do Ministério da Saúde e uma equipe é credenciada. Alguns deles eram membros desta equipe”, disse o juiz.
As condenações provocaram também a reabertura do inquérito referente à morte de Carlos Henrique Marcondes, o Carlão, que foi diretor administrado do Hospital Santa Casa até o ano de 2002. Ele foi encontrado morto na época com um tiro na boca dentro do próprio carro.
FONTE

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